O mundo de "A Guerra das Sombras"

Ao escrever "A Guerra das Sombras" busquei evitar sobrecarregar o leitor com informações sobre o mundo. O que eu queria era contar uma história; não apresentar um cenário de RPG. Nada contra RPG! Apenas acho que escrever literatura é algo muito diferente de desenvolver um cenário ou uma campanha. O que no RPG pode ter um papel principal, na literatura torna-se um detalhe. Porque o que mais importa na literatura são os personagens, o enredo e, obviamente, a habilidade do autor de traduzir esses elementos sob a forma de um texto bem escrito. Mapas e coisas de gênero são pouco importantes. Isso não significa que eu não tenha desenvolvido tais elementos o melhor que pude, mas apenas que eu os releguei a um segundo plano. Eles estão lá, invisíveis muitas vezes, ajudando a sustentar o enredo, conferindo verossimilhança a certos momentos, desempenhando silenciosamente sua missão nos bastidores.

Como disse num outro artigo, o leitor pode encontrar informações mais ou menos detalhadas sobre o mundo facilmente no meu site. Encontrará na seção mundo relatos parciais, produzidos a partir da perspectivas de estudiosos que habitam o universo de "A Guerra das Sombras" (de historiadores, de cartógrafos, de teólogos). São, portanto, relatos subjetivos e sujeitos ao erro. Não existe, porém, uma visão geral. De onde surgiu o mundo? Que deuses o criaram (se é que existiam deuses)? Essas questões ficam sem resposta. Até sobre os tempos antigos, que tratei em outro artigo, pouco se sabe.

O mérito da seção, porém, é permitir compreender as grandes forças que moveram a história mundial dos últimos dois mil anos e identificar o efeito dessas forças nas regiões em que se passa o romance. A primeira delas é, sem dúvida, a queda do Antigo Império. Sabe-se que, por talvez por milhares de de anos, um único governo dominou a maior parte do mundo, seus três principais continentes. O poder da antiga ordem foi erodido lenta e dolorosamente por séculos de guerra civil até que, cerca de dois mil anos antes dos eventos descritos no romance, estivesse completamente desarticulado, extinto. A desordem desse período teve efeitos palpáveis que ainda podem ser sentidos no tempo de Rairom. Esses efeitos foram amplificados por processo de desertificação, de causas desconhecidas. O resultado mais óbvio da combinação desses dois fenômenos foram as migrações.

De fato, salvo raríssimas exceções (como os triot), nenhum povo que habita a Terra das Sombras ou a Península Oriênica, ali estava dois mil anos antes. As nações atuais são resultado de correntes migratórias e dos conflitos que daí nasceram. A Terra das Sombras, por exemplo, teve duas correntes principais: os norgam e os silai. O Império é fruto não só da conquista mas, talvez principalmente, da combinação deses dois povos. Os norgam, igualmente, tiveram papel importante na colonização da fértil Península Oreânica, juntamente com duas outras levas humanas que também vieram pelo mar (os delones e os alguianos) e outras tantas que provêm de regiões do próprio Continente (os oreanos, certas tribos averonitas, os trolnaquianos e diversos grupos larani - como o povo de Iadi e os sagrianos).

Esse, ao que parece, é ponto inicial para compreender o mundo de "A Guerra das Sombras", um mundo fruto da decadência de um império, que, mesmo sem saber, vive as conseqüências de um passado já quase esquecido. Um passado que não está morto, mas que, ao contrário, reverbera de forma poderosa sobre o presente, ameaçando determinar de forma irreversível o futuro.

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