Impressões sobre Fronteiras do Universo

Resolvi fazer uma análise um pouco impressionista de "Fronteiras do Universo" de Philip Pullman. Não é propriamente uma crítica do livro (não sou nem quero ser crítico literário!). Trata-se apenas de uma pequena ponderação de elementos positivos e negativos com que me deparei durante a leitura.

Pelo lado positivo, o primeiro ponto que me chamou a atenção foi a maestria com que o autor desenvolveu o enredo. Às vezes, quando a história adquire um bom ritmo, é até difícil parar de ler. Essa, sem dúvida, é a marca do bom escritor. Quando o livro tem essa qualidade, muitos de seus defeitos podem ser perdoados. Mas o que exatamente prende minha atenção como leitor? Acho que é a combinação entre um encadeamento de eventos inteligente e um pouco imprevisível (que me leve sempre a perguntar "O que vem a seguir?") com personagens que despertem meu interesse. Em Fronteiras do Universo, os personagens são muito bem construídos, a começar pela protagonista, cuja personalidade é complexa e cativante. A Senhora Coulter também é uma personagem excepcional. No que tange aos personagens, o autor foge muito bem do maniqueísmo.

No decorrer dos três livros, há momentos líricos e de uma beleza ímpar. Isso se deve principalmente à forma muito apropriada com que o autor desenvolveu seus mundos paralelos. Assim, mesmo sendo uma obra que poderia ser rotulada como "low fantasy", o autor consegue criar uma sensação de Maravilhoso que é a marca registrada do gênero Fantasia. E após a longa jornada por universos paralelos e pelo além, o leitor se depara com um final particularmente impactante, apesar de não ser muito surpreendente. Desde que li Humilhados e Ofendidos de Dostoievski não havia encontrado uma conclusão que me deixasse uma impressão tão forte. Já li críticas sobre o final escolhido pelo autor com base no fato de que não é muito plausível. Não é mesmo. Por outro lado, sou forçado a concordar com Pullman quando afirmou que a história não teria nem um décimo da sua força se o final fosse diferente.

O pior defeito do livro, na minha opinião, é o aspecto propagandístico. O autor exagerou um pouco em sua defesa do ateísmo e em sua crítica ao cristianismo. O livro se parece com Narnia, que também exagera, só que no sentido oposto. A vontade de defender certo ponto de vista está muito presente no livro, mas eu, como leitor, não quero ser doutrinado. O livro seria melhor se abrisse espaço para ambigüidades. Se o autor escapa bem do maniqueísmo quando desenvolve seus personagens, mergulha neste problema ao defender uma tese sem hesitações. Em Fronteiras do Universo, a religião é uma coisa ruim, sem aspectos redentores. É uma ferramenta de opressão conduzida por seres mal-intensionados. Para muitas pessoas religiosas essa abordagem deve ser bem irritante, mesmo porque não corresponde à verdade dos fatos. A religião, como tudo na vida, tem pontos positivos e negativos.

Outro problema são as falhas no enredo. Por exemplo, a mudança da Senhora Coulter me pareceu brusca demais e pouco convincente. Também não me convenceu a súbita disposição dos fantasmas de serem "desintegrados". Dá para aceitar que alguns deles quisessem. Mas "a vontade de existir" é algo muito fundamental para a maioria das pessoas, algo de que é difícil abrir mão sem um motivo muito forte. Existem muitas outras falhas semelhantes ao longo do livro.

Pesando os prós e o contras, Fronteiras do Universo é uma leitura que vale a pena para quem é fã do gênero e não se incomoda em ler uma obra que defende claramente (e sem ambigüidades) determinado ponto de vista.

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