Ariela e o arco da história

Um leitor fez a grande gentileza de se dar ao trabalho de escrever uma crítica do segundo livro. Segue a análise do leitor e meus comentários:
Leitor:

Quando o livro foi lançado, em meados do ano passado, eu fiquei ansioso para comprá-lo, tanto que, logo depois, o fiz. Tinha outras leituras na frente, mas eu dei um jeito de atrasá-las a fim de começar a leitura do livro.


Bem, o que posso dizer? No começo, eu me senti um pouco... estranho? O livro de Dinaer tinha me cativado, tanto pela história, como pelo modo como esta foi narrada. A impressão que eu tive foi que Ariela era, definitivamente, mais fraca do que Dinaer, em todos os aspectos: como personagem, como narradora... consegui chegar até o final do quarto capítulo, mas eu acabei deixando o livro de lado. Para mim, a narrativa estava andando muito devagar, e eu tive o pressentimento de que o resto da história seria mesmo mais fraca do que a do livro anterior.

Há umas duas semanas, resolvi dar uma nova chance ao livro. Para isso, reli, com prazer, o primeiro volume, do qual minhas únicas críticas são alguns erros gramaticais, que podem facilmente ser corrigidos. Depois, passei à história que eu havia deixado de lado, certo de que minha visão poderia muito bem mudar. E eu estava certo!

Novamente, a minha única crítica ao livro foram erros gramaticas, porque o resto... nossa! Quando eu passei do quarto capítulo, não consegui mais desgrudar do livro! A trama consegue ser ainda mais envolvente do que a do Livro de Dinaer. Ariela, que no início se mostrou uma jovenzinha antipática e mimada, foi amadurecendo à medida que acompanhou Rairom na viagem. Quantas revelações tu trouxeste para nós, Jorge! A cada página, ansiava para descobrir mais. Confesso que os eventos das últimas páginas foram deveras surpreendentes. Todas as impressões negativas que tive na primeira leitura interrompida se foram.

Talvez, em alguns momentos as falas dos personagens sejam formais demais - como as do primeiro livro -, mas a história, em si, faz com que deixemos de lado estes pequenos defeitos.


Meus comentários:

Obrigado pelos seus comentários! É sempre importante receber esse retorno dos leitores. É bom saber que mais pessoas que leram o primeiro volume estão dando uma chance para a segunda parte também.

Você não é o primeiro a reclamar do início do segundo volume, em geral, e da Ariela, em particular. Como você sabe, outros já fizeram o mesmo. Concordo que o início é um pouco parado e entendo que Ariela irrite alguns leitores. Sei que eu talvez seja um pouco cabeça-dura a esse respeito, mas sinceramente acho que tanto Ariela quanto o início do livro são o que tinham que ser. No caso da narradora, ela é uma princesa e portanto é mimada e arrogante. Seria estranho se fosse diferente. Uma pessoa que é bajulada de todas as formas desde a primeira infância, que é ensinada a se comportar como se fosse superior às outras pessoas, vai acabar se tornando um pouco petulante mesmo. O interessante em Ariela, na minha opinião, é a mudança por que ela passa durante o livro, como você mencionou. Ela tem sua visão de si mesma e sua visão de mundo seriamente desafiadas - é isso o que me interessa na personagem.

Quanto ao início do livro, acho que exemplifica bem meu objetivo ao escrever "A Guerra das Sombras". Não queria escrever mais um épico. Não queria apenas uma história cheia de "ação e aventura". É claro que há muita ação, mas o foco está nos personagens. A ação e o enredo estão a serviço do desenvolvimento dos personagens - não o contrário. É por isso que há lacunas sem ação, em que o desenvolvimento dos personagens prepara o terreno para eventos futuros. E muito é preparado naqueles capítulos iniciais.

Sei que talvez essa não seja a forma mais inteligente de escrever - se o objetivo é o sucesso de vendas. O primeiro capítulo deve, em tese, ser capaz de sugar a atenção do leitor. Nesse sentido, faço uma autocrítica. "A Guerra das Sombras" provavelmente não é uma boa peça mercadológica, o livro não se revela desde o início, não convida nem absorve o leitor desde logo. Como Angus, por exemplo, com suas belas figuras. Ou como algumas histórias do Vianco que conseguem prender o leitor desde o primeiro parágrafo. Isso não é uma crítica a esses dois autores: é um elogio. Se "A Guerra das Sombras" fosse uma pessoa, seria um sujeito introspectivo, um cara talvez não muito simpático, mas que vale a pena conhecer.

Veja "O Livro de Dinaer", por exemplo. Em vez de começar no capítulo IV, e portanto, com alguma ação, eu situei o início anos antes e fiz uma apresentação dos quatro volumes ali. Mas para aquele que não leu os volumes posteriores, isso vai passar despercebido, é inevitável. Agora que você terminou de ler o segundo volume, você pode perceber que a invasão da Península Oreânica, tema central do segundo livro, é apresentada no capítulo III do volume I. Da mesma forma, o olho de Crion, um dos temas centrais do terceiro livro, é apresentado no capítulo II de "O Livro de Dinaer". Poderia continuar mencionando mais detalhes como a apresentação de Jonorat e Jonalat, dois personagens que só terão papel importante no segundo livro e do mestre das sombras Zoltari de Nemaelos, que só reaparece com importância no livro III. Por que fiz isso? Por que não comecei logo com a ação?

Porque, no final das contas, o livro fica mais bonito e interessante desse jeito. Isso não quer dizer que outras pessoas vão partilhas dessa opinião: podem muito bem desistir já nas primeiras páginas. Ler "A Guerra das Sombras" não é como descer uma ladeira. É como escalar uma colina - mas a visão lá de cima vale a pena! A diferença entre mim e os leitores é uma só: eu vejo o grande arco da história, sei como tudo termina, e levo isso em conta ao escolher caminhos. O escritor é um guia: ele escolhe os caminhos. Cabe ao leitor optar se vale a pena acreditar que o guia irá levá-lo a um bom destino, mesmo que o caminho pareça um pouco tortuoso no início. Um livro grande como "A Guerra das Sombras" é como um enorme quebra-cabeças. Nesse sentido, as peças são menos importantes do que a imagem do todo formada quando a última peça se encaixa. Fazer essa imagem a mais bela possível - é esse o meu objetivo. Se isso significa, fazer alguns capítulos sem ação, ou personagens petulantes, estou disposto a fazer isso. Ainda assim, pelos comentários que recebi até hoje, acredito que "A Guerra das Sombras" tem o potencial de prender a atenção do leitor e, levando em conta o todo, não é um livro modorrento - muito pelo contrário.

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